(já escrevi várias coisas e apaguei pelo simples fato de não saber por onde começar a falar sobre succession. a série hypou, galera aguentou firme quatro temporadas nesse drama de família bilionária e fiquei super tranquila durante esse furor todo, pois não me interessava saber que raios bilionários faziam, pra mim não tem nem que existir. mas um episódio de podcast e uma olhada mais de perto nos diálogos e na organização de determinados símbolos fez com que eu me apaixonasse pelo drama sarcástico da família roy).
“succession é uma série sobre bilionários se fudendo”. muito li e ouvi essa frase enquanto a série hypava loucamente nas redes sociais. ano passado, se não me engano, assisti ao primeiro episódio e fiquei: meh. não quero. não tenho paciência pra isso.
porém, quando ouvi o episódio do bom dia, obvious sobre a série (com desatenção para não memorizar os spoilers) o comentário de que o programa deveria ser assistido pela perspectiva da sátira, da comédia e como os diálogos eram bons, cês sabem: isso me pegou.
discordo um pouco que olhar succession como comédia resolva o problema de um ranço inicial, pois, sim: essa gente é ridícula, mas não somos exatamente levados a rir deles. a filmagem, como foi destacado no podcast, lembra um pouco a vibe de the office, mas ainda assim temos um abismo entre a comédia e o drama de succession.
no plano da semiótica eu tô tendo um treco a cada episódio. mas vamos por partes.
o enredo:
logan roy, bilionário da indústria midiática (jornal, TV), está prestes a completar 80 anos, mas não anda lá essas coisas de saúde. a sucessão de seu posto na empresa é uma pauta e seu filho, kendall, tem grandes expectativas quanto a isso, pois logan, em tese, passaria o bastão pra ele. porém, o logan meio que diz “ah não tô a fim, quero continuar como estou” e isso deixa o kendall meio puto da cara.
resumindo: a saúde do logan (que quase bate as botas no episódio 1), as decisões malucas que ele quer tomar e a sede dos filhos por ocupar um espaço nos negócios e no coração inexistente de seu papi impulsionam a trama da série. são quatro criaturinhas roy: connor, kendall, roman e siobhan.
connor é o filho do primeiro casamento e não está lá muito sedento pelo trono. ele é um típico estadunidense rico e burro (pleonasmo) que vive num deserto e se acha o próprio thoreau da modernidade.
siobhan é a querida do papai (será mesmo?) e apostou na carreira política (assessorias) para se distanciar da imagem rançosa que os roy possuem diante da sociedade.
kendall é o filho mais envolvido nos negócios, embora seja bastante inseguro na tomada de decisões e viva à sombra de logan.
roman, pra mim, é um dos personagens mais hilários da série. ele é escroto, inconveniente, incompetente, faz o possível e o impossível para conseguir a aprovação do pai, que o despreza constantemente, e ainda assim é o mais honesto de todos eles. roman mostra a sua verdadeira face e expõe a face dos outros que tentam se esconder e, quando faz isso, só mostra o quão ele e os outros são abjetos. aqui eu tô puxando a honestidade para o âmbito do “não tentar mostrar aquilo que não é”, na mesma linha que a gente pode dizer que o b*lson*ro nunca foi exatamente um mentiroso, porque ele sempre assumiu seu preconceito, seu ódio e incompetência.
ainda, podemos dizer que no jogo dos bilionários as regras são outras e por isso as coisas ficam caricatas, porque gente rica pode ser bem ridícula a maior parte do tempo.
é evidente que logan enxerga as pessoas — e seus filhos também —, como pecinhas de um jogo qualquer e constantemente os manipula para alcançar seus objetivos. as crias possuem a ganância bilionária, mas a busca por aprovação e o amor de logan subjazem as outras tantas relações.
aqui a gente consegue ver que as relações familiares e relações de negócios ficam bastante nebulosas e os contextos também se sobrepõem. um exemplo disso é um episódio em que roman vê um de seus empreendimentos dar super errado. nessa cena, ele está no banheiro acompanhando tudo pelo celular e, quando as coisas terminam péssimas, ele guarda o telefone no bolso, lava bem as mãos, seca as mãos, e depois limpa os cantos da boca. o lavar as mãos aqui é bem simbólico e é nisso que succession me pega demais, nesses detalhes que um telespectador desatento pode deixar passar.
outro exemplo é o episódio hunting, da segunda temporada. a caçada real que acontece durante um retiro dos ricaços na hungria é sobreposta pela caçada psicológica que logan faz a todos aqueles que trabalham com ele. logan está obcecado por comprar uma rede de notícias muito respeitada e simplesmente ninguém tá tankando esse plano doido. porém, ele fica bem paranóico e ele vai caçar, humilhar mesmo, todos os seus parças até descobrir quem está contra ele.
até o momento, e a série pode me enganar quanto a isso nas próximas temporadas, succession é o embate entre logan e kendall. os outros filhos servem para atenuar a dinâmica, mas a meu ver a questão principal é a luta logan e kendall.
logan não perde tempo com roman, manipula a siobhan, o que dirá de connor que ninguém leva a sério, mas quando o assunto é o kendall é outra história. e é esquisito demais como amor e ódio entram nessa relação.
em vários momentos, logan demonstra (ou quer enganar todo mundo) que kendall é o preferido, mas essa preferência se dá pela dor e não pelo amor. de modo a fazer de kendall um fodão dos negócios o logan vai ferrar com o psicológico do filho e vai usar toda e qualquer oportunidade para fazer chantagem emocional com o cara.
dito isso, lembrei de outra fase famosa sobre a série: “succession faz a gente sentir empatia pelas personagens”. ha ha ha. de jeito nenhum. se você empatizou, procure ajuda.
claro que eles possuem emoções, fraquezas e vontades. só que é impossível enxergar aquela família como pessoas cotidianas.
é perigoso olhar para os bilionários como uma categoria de não-pessoas, tão diferentes de nós que é quase como se fossem deuses. mesmo que a gente os considere monstros, dá pra perder muita coisa no debate se a gente reduzir tudo a isso: não têm sentimentos, são monstros. se são monstros, não são passíveis de julgamento, não são passíveis de punição. assim como os deuses também. e se é assim, que pena, não dá pra fazer nada contra eles.
pelo contrário: gente muito rica tem sentimentos, sim. talvez a diferença seja o modo como direcionam as suas pulsões. talvez o amor que sentimos por estar perto das pessoas que a gente gosta seja transferido no plano bilionário pelas borboletas na barriga ao fechar um grande negócio. vai saber, nunca fui rica, nem perto disso (mas deus se quiser me testar, me sinto pronta).
outra coisa curiosa sobre a série é que não tem cena de sexo. estou no quinto episódio da segunda temporada e o máximo de sexo que teve foi o kendall e a rava (temporada 1) e mesmo assim, muito sutil para uma produção da hbo. nem na despedida de solteiro do tom (genro do logan), que era pra ter sido a orgia das orgias, teve cena de sexo. isso diz algo pra vocês? pra mim diz algumas coisas.
nas minhas anotações sobre succession, pensei em kendall como um espelho de e para logan. o pai quer talhar o filho até que esse fique pronto para assumir seu posto, no entanto, não consegue transformar kendall num filhadaputa tal qual ele é (kendall será um filhadaputa do seu próprio jeitinho).
apesar de toda escrotidão que rola naquela família, o kendall se preocupa em ser um pai legal para os filhos, por exemplo. a problemática dele, pra mim, reside nessa fixação em querer tomar o posto do logan a qualquer custo, ainda que sob a desculpa de que é só pra salvar os negócios da família do pai tirano e caquético. embora os personagens da série sejam bem homogêneos (maniqueístas?) (tipo você nunca vai ver o roman sendo legal com alguém), ainda assim existe a mistura de símbolos das relações.
a família é um negócio, salvar o negócio da família é salvar a família?
enfim, coisas.
no mais, só posso dizer que essa série me fascina pela quantidade de sutilezas visuais e também dos diálogos descaradamente diretos que permeiam essa história de aparência tão simples — furdunço de família por causa de dinheiro —, mas que deixa a gente meio que hipnotizado.
eu já sei em qual temporada acontece uma coisa importante, porém pra mim não importa que isso aconteça, e sim quais outras coisas vão acontecer até culminar neeeeeeeesse pontinho aí.
sei lá se convenci alguém a seguir o hype, só posso dizer que me empolguei demais com tudo e pensei a semana toda em como colocar essa animação em palavras. não cheguei nem perto do que idealizei comunicar.
tá bom por enquanto.
merchan ruído branco
vamos ler uns poemas para alegrar a vida? (já comecei mentindo)
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por hoje é só, galeres
sue ⚡